28 de abr. de 2015

E mais uma vez o dia foi salvo, graças... a quem?

Hoje foi um dia atípico.


Na hora do almoço, enquanto eu atendia sozinho ao público no meu trabalho, eis que um senhor se irou contra mim. Eu apenas lhe fiz algumas perguntas habituais e pedi seu documento de identificação para poder dar prosseguimento no atendimento. Essa é a forma de proceder, esse é o protocolo. Mas ele tava sem os documentos e se irritou. Se levantou de sua cadeira e subiu o tom de voz. "Não precisa fazer nada não. Eu vou voltar outra hora. Não tá querendo trabalhar? Tá com preguiça de trabalhar? Não tá querendo fazer nada?? PREGUIÇA! Esse cara tá com preguiça e não quer me atender direito!"

Pude ouvir estático suas rudes palavras ao passo em que ele ia deixando o lugar irritado. Ele já estava pro lado de fora da agência e eu ainda ouvia ele me ofendendo em alto e bom som.

Certamente aquele senhor já entrou ali irritado com alguma coisa e aproveitou para descontar toda sua raiva em mim, Talvez já tenha se frustrado muito com a instituição e viu ali a oportunidade de escancarar sua indignação.

Olha, eu não entendi muito bem o que aconteceu. Foi rápido e desproporcional.

Eu sempre procuro atender a todas as pessoas com dedicação e urbanidade. Com respeito e atenção, como se fosse um familiar meu. É dever de um servidor público. E modéstia à parte, eu me esforço muito pra me manter sempre nesse ritmo de cordialidade. Inclusive na semana passada um amigo da instituição e eu debatemos muito sobre isso. Claro que há dias em que não é fácil se manter prestativo e sorridente, mas agir dentro dos padrões mínimos de ética e presteza é o que se espera daquele que é remunerado para servir ao cidadão.

Só sei que eu fiquei muito mal com isso. Fui almoçar totalmente desolado. Não sabia como lidar com aquilo, pois nem soube como reagir. As poucas palavras que consegui exprimir não poderiam expressar o que eu realmente queria dizer.

Em um grupo de amigos no Whatsapp eu desabafei sobre o ocorrido. Entre as palavras de consolo, uma amiga me enviou o texto bíblico que me acalmou e me trouxe algum alento:


E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos;
E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo:
Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus;
Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados;
Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra;
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos;
Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia;
Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus;
Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus;
Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus;
Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa.
Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.


Voltei ao trabalho e, apesar das palavras, eu ficava pensando no ocorrido. Voltei à minha mesa e revivi aquilo. Eu sabia que precisava encarar a situação, deixar aquele sentimento ir. Mas eu não sabia exatamente como lidar com aquela carga negativa. O sentimento de injustiça tentava me puxar pra baixo. Uma mistura de revolta contida, com raiva. Questionando o porquê.

Eu ouvi essa semana algo sobre a raiva. O sentimento de  raiva nada mais é que uma forma de esconder ou disfarçar um sentimento ainda maior, que é a tristeza. Acho que é tipo uma reação natural do ser humano. Infelizmente, é a única forma como você consegue reagir em determinadas situações, embora saiba que não deve ser assim. 

Após o expediente, no final da tarde, eu saí do trabalho e decidi passar num mercado para comprar um fio dental. Meu fio dental havia acabado, e era de fundamental importância que eu fosse comprar fio dental. (rs)



Ok, eu nunca vou ao mercado após o trabalho. Ainda mais para comprar um fio dental.

Aliás, eu quase nunca vou ao mercado que eu fui hoje. Frequento outros.

Mas o fato é que hoje eu fui àquele mercado, e comprei o fio dental. Aproveitei e peguei um pão. Em certo momento percebi naquele mercado uma mulher que me olhava. Ela era funcionário do local.  Eu mudei de corredor mas ela mudou também, e apareceu na minha frente por uma fresta entre os corredores. 

Ela começou a falar comigo sobre seu processo de aposentadoria. Seus olhos azuis me fitavam como se fossemos velhos conhecidos. Eu tentei me esquivar, mas ela não permitiu. Após um pouco de esforço, eu consegui me lembrar dela, que esteve no meu trabalho há poucas semanas. São muitas pessoas diariamente, e é difícil gravar na memória. 

Eu não queria tratar de trabalho ali. Ainda mais num dia desses. Foi a primeira vez nessa cidade que fui abordado na rua, ou fora do trabalho, por causa do trabalho. Geralmente passo desapercebido aqui. E o mais irônico é que eu tinha refletido sobre isso na semana passada, também. Sobre esse quase anonimato que nunca ocorre em cidades pequenas.

Pois ela me reconheceu. E inesperadamente começou a me elogiar. E a elogiar meu trabalho, e dizer que eu era muito atencioso. E a dizer que estava nervosa e com receio quando foi lá na agência, e com medo de ser maltratada. Mas que meu atendimento fez a diferença, e que inclusive ela havia comentado isso com seu advogado. Nesse momento eu não resisti e desabafei: "Jura?? Porque hoje mesmo eu fui xingado e maltratado naquele lugar, e já nem sei mais.." Ao que ela respondeu: "Não liga pra isso! Deus é contigo. Estou rezando por você, vai dar tudo certo".

Esse foi o ponto alto do meu dia. Eu sinceramente não esperava por mais nada hoje. Estava ali lidando com minha dor, aquele sentimento de injustiça, de rejeição, e até mesmo de inferioridade, quando uma pessoa surge entre as prateleiras de um mercado (que eu não frequento) e me diz coisas lindas, sobre quem eu realmente sou. E me faz ver que sim, todas as coisas cooperam para o bem daqueles que O amam.  E eu pude ver um sentido em tudo aquilo. E que Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados!

Eu pude ver nisso tudo o carinho e o cuidado de Deus por aqueles que o temem. Me senti intensamente abraçado, amado. Me emocionei e isso tudo foi real. Tão real como se eu pudesse tocar! É o amor de Deus!

Eu sai de lá como se o dia houvesse começado de novo. Agora tudo voltara a fazer sentido. 

Dei umas voltas de carro, e inacreditavelmente voltei a cruzar com aquela senhora, algumas quadras longe do mercado. Ela não me viu, mas eu a vi e sim, percebi a confirmação de que aquele abraço era o abraço do próprio Deus. Não se tratava daquela homem, nem daquela senhora, nem daquele mercado. Era uma mensagem muito maior que tudo e todos!

Refaço minha afirmação do início. Não foi um dia atípico. Foi um dia típico. Porque todos os dias Ele nos guarda, nos protege e nos mantém em sua graça. Tipicamente, seu Amor. 

A questão é que nós é que levamos muito tempo para perceber isso. Ou precisamos de uma situação inusitada como essa para se dar conta. Mas Ele está sempre aqui, nos guardando, nos mantendo vivos. No controle. Sempre, todos os dias!


E mais uma vez o dia foi salvo, 
graças Àquele que trabalha sempre em nosso favor. 

Eu sou grato :)